Nota: 10

Dizer que Martin Scorsese entende de cinema é ser redundante, dizer é fã de filmes clássicos também não é muita novidade, ao menos para quem acompanha sua carreira desde que chamou a atenção do mundo com filmes como "Caminhos Perigosos", "Taxi Driver" e se estabeleceu como um dos maiores cineastas de todos os tempos com filmes como "Touro Indomável", "Os Bons Companheiros", "A Época da Inocência", "Cassino" e do Oscarizado "Os Infiltrados". Scorsese é um homem de cinema, não só por seu trabalho como diretor, mas como historiador, e "A Invenção de Hugo Cabret", o primeiro filme "família" de Scorcese (ao menos é assim que vem sendo vendido) é a maior prova disso. "Hugo" conta a história do jovem órfão Hugo Cabret (Asa Butterfield) que vive escondido na central de trem de Paris dos anos 30. Hugo cuida dos relógios do Lugar e tenta se manter invisível, escapando de ser mandado para o Orfanato pelo Guarda da Estação (vivido por Sacha Baron Cohen). O Menino guarda um incrível segredo, que é posto em risco quando o severo dono da loja de brinquedos da estação e sua afilhada Isabelle (Chloë Grace Moretz), cruzam seu caninho. Um caderno valioso e um homem mecânico estão no centro da intrincada e imprevisível história, que presta uma bem vinda homenagem aos pioneiros do cinema mudo.
Aos desavisados "A Invenção de Hugo Cabret" pode parecer mais uma adaptação de um livro de sucesso, tentando ser um novo Harry Potter ou um de seus similares como Percy Jackson, Eragon, a campanha publicitária inclusive ajuda a dar essa impressão, porém o filme é muito mais do que isso, é uma celebração da imaginação humana, de sua engenhosidade. "Hugo" é exatamente isso, imaginativo, engenhoso e extremamente criativo.
Além de ser o primeiro filme de Scorsese para toda a familia , este é o primeiro longa do diretor em 3D, e ele tira total proveito do formato, captando imagens belissimas de uma Paris que parece ter saido de um conto de fadas. A fotografia de Robert Richardson é belíssima e o 3D assim como o de "Avatar" complementa o visual ao invés de ficar distraindo a atenção da platéia,  jogando coisas na direção do espectador (sim, as pessaos acham que 3D de cinema é igual ao de parque de diversões), e o diretor raramente quebra a 4ª parede e investe na profundidade de campo,  para fazer com que o visual do filme salte aos olhos. O filme mereceu cada indicação ao Oscar desse ano, foram 11 indicações ao prêmio da Academia (incluindo Melhor Filme) e também mereceu a aclamação junto à crítica, onde entrou para inúmeras listas de melhores do ano.
Porém, não é só a parte técnica que chama atenção (afinal a direção de arte, figurinos, efeitos visuais, são impecáveis), mas o fato do filme ser afetuoso, delicado e de fácil empatia com o público, principalmente graças a seu elenco, Asa Butterfield (O Menino do Pijama Listrado) está perfeito como Hugo, em uma performance extremamente delicada e cheia de nuances. Ele é bem acompanhado pela talentosa Choë Grace Moretz (500 Dias Com Ela, Kick Ass) e por Sir Ben Kingsley (Gandhi, A Lista de Schindler) como o pioneiro diretor Georges Méliès, em uma belíssima homenagem ao cinema mudo.
Na verdade é na participação de Méliès na trama de Hugo que pode se encontrar a motivação de Scorsese ao dirigir o projeto, penso que ele gostaria de ser o próprio Hugo e se aventurar por uma Paris do século passado, ajudando a redescobrir um gênio há muito esquecido, de certa maneira, é isso que o filme faz, de uma maneira bastante afetuosa, Scorsese leva ao público moderno uma visão única do inicio do cinema, desde o momento em que os Irmãos Lumiére exibiram "A Chegada do Trem à Estação" (O pai de todos os filmes, afinal foi o primeiro), passando pela vida e obra de Méliès, mágico e inventor que revolucionou as técnicas de filmagem, usando truques que impressionam pela criatividade, em uma era que não havia empresas de efeitos visuais e tudo era feito na frente da câmera.
O amor de Scorsese pelo cinema é sentido em cada cena de "Hugo", não só na maneira como homenageia o cinema mudo, mas na maneira como o cineasta usa todos os recursos para contar uma boa história, como todos os filmes deveriam fazer, levando o público para dentro da trama, para perto dos personagens. É uma pena que como muitos filmes de grande qualidade, "A Invenção de Hugo Cabret" esteja fadado a ser atropelado por inúmeros filmes de qualidade duvidosa (e inferior) nos multiplexes da vida, simplesmente por não ser um filme nem para adultos e nem para crianças, mas para os sonhadores que existem lá fora, de todas as idades, e por não ser como a maioria dos blockbusters, apesar dos inúmeros efeitos visuais, sendo sim um poema de amor ao cinema, à arte e ao espirito imaginativo do ser humano. Infelizmente estrear na mesma temporada de franchises conhecidas como "A Saga Crepúsculo - Amanhecer Parte 1" (sem maiores comentários sobre essa atrocidade que chamam de filme), do ótimo retorno de "Os Muppets" (sim, há vida inteligente lá fora) e do bacana "O Gato de Botas", não ajudou, mas ainda assim, há chances de o público descobrir essa jóia rara, se não no cinema, em dvd e na tv com o passar dos anos, afinal bons filmes nunca morrem, e filmes espetaculares sobrevivem ao teste do tempo.
"A Invenção de Hugo Cabret" é um filme espetacular que não passa duas horas distraindo o público de sua história, gritando "olhe como sou um filme espetacular, porque tenho efeitos especiais" ou jogando coisas para fora da tela para provar que foi feito em 3D, pois assim como os trabalhos anteriores de Martin Scorsese, ele deixa você mergulhar em seu mundo particular e desfrutar de sua magia, preenchendo a tela de emoção, e se as lágrimas chegarem, foi porque ele alcançou seu coração. Sim, isso é o que um bom filme deveria fazer.
Hugo, 2011 direção de Martin Scorcese roteiro de John Logan baseado o livro de Brian Selznick produzido por Graham King, Thimothy Headington, Martin Scorsese e Johnny Depp musica de Howard Shore montagem de Thelma Shoonmaker direção de fotografia Robert Richardson com Asa Butterfield, Chloë Grace Moretz, Ben Kingsley, Sacha Baron Cohen, Jude Law, Christopher Lee, Ray Winstone e Emily Mortimer duração 128 minutos distribuição Paramount Pictures. Fantasia/Aventura.
 



 
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